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Então é Natal!

Observo minha árvore de Natal, cheia de pacotinhos prateados com bilhetinhos da Amazon e penso: como mudamos nossos hábitos nas últimas décadas! O mês de dezembro sempre me leva para algumas memórias afetivas que construí na infância e que podem ser um tanto clichês, mas são bastante significativas para a minha formação humana. Lembro-me de sair com minha mãe ou com minhas tias e percorrer a pé as ruas lotadas do centro de Belo Horizonte em busca de presentes ou lembrancinhas para nossos entes queridos e o tradicional presente de amigo oculto.

Eram dias bem divertidos para mim, enquanto que para minha mãe nem tanto assim. Mas na minha inocência infantil não poderia mensurar o que se passava em sua mente naqueles momentos. Seguíamos nosso caminho de mãos dadas, as ruas fervilhavam de transeuntes cheios de sacolas nas mãos, pessoas de todos os estilos e classes sociais circulando por ali e a cidade estava toda decorada com bolas brilhantes, árvores de Natal, Papais Noéis, fitas vermelhas e verdes, pacotes de presentes, renas e presépios. Tudo brilhava e era lindo.

Sair para ver a decoração de Natal à noite era incrível. O mirante da Avenida Afonso Pena ficava bem cheio e tínhamos uma vista privilegiada da cidade iluminada. A Praça da Liberdade sempre foi uma atração à parte: se transformou em um ponto turístico de Natal. Além disso, muitos coros se apresentavam pela cidade, trazendo uma áurea de magia, sendo difícil alguém ficar indiferente a todo esse clima de festa no ar. Também era bastante comum na época da minha infância ter Papais Noéis circulando pelo centro da cidade e distribuindo balas para as crianças. Depois de tantas andanças e poucos presentes, era confortador receber um mimo do bom velhinho.

Um tempo depois entramos na era dos Shopping Centers. Dessa forma a magia das ruas se perdeu, assim como o seu comércio mais sofisticado. O centro da cidade deixou de ter aquelas lojas bonitas e interessantes que puxavam o transeunte para dentro. Estes magazines se transferiram para os shoppings e assim, como bons gados que somos, transferimos nossas compras para esses centros de comércio que traziam junto com o seu conceito um tanto de impessoalidade para a data. Os shoppings são ambientes seguros, seletivos e que nos protegem da violência das ruas. Além disso, ele nos permite comprar muitas coisas em um só lugar, concentrar tudo ali dentro e geralmente, gastar mais que o previsto.

Por mais que caprichem nas decorações natalinas e nas atrações para chamar os clientes, ainda me lembro com saudades dos lanches podrões das Lojas Americanas (que nem servem mais lanches), das finadas Slopper, Mesbla e Sears, onde comprávamos com muita parcimônia alguns itens das nossas listas de presentes. Mas, principalmente sinto falta das pessoas comuns que circulavam pelas ruas chuvosas de BH, dividindo este espaço em busca do presente ideal. Os shoppings nunca terão essa magia!

Porém, em 2020 tudo mudou para valer! Até mesmo os shoppings perderam essa pulsação do Natal para o Covid-19, que nos obrigou a adotar novos hábitos, comprar nossos presentes pela internet. Pensando na praticidade, é ótimo: não saímos de casa para comprar, temos uma opção vasta de produtos, lojas, preços, etc., porém, perdemos no quesito pessoalidade. Penso que minha filha não vivenciou essas experiências que constituíram a minha memória afetiva com a data. Ela sempre foi ao shopping para comprar qualquer coisa, desde muito cedo deixou de acreditar no Papai Noel, apenas cumpria um ritual para a foto do ano e o que interessava mesmo eram os presentes.

Talvez por isso muitas pessoas não gostam dessa data e afirmam ser o Natal uma ocasião para vender mais, uma data comercial. Coloca-se muito em contraponto as diferenças sociais e econômicas presentes no Brasil: enquanto uns se fartam, outros passam necessidades. Porém, o Natal, suas tradições e ideologia são importantes para a reflexão sobre nós e sobre o outro também. Sei que escrevo esse texto sentada em um pedestal de privilégios, tanto que na minha árvore contém diversas lembrancinhas. Tenho uma família com quem compartilhar esses momentos e teremos uma ceia natalina tradicional. Muitas pessoas não têm nada disso e pior, nunca tiveram. Ainda assim, nesta época do ano a generosidade é maior que no restante dos dias, o que é um pouco triste, mas também pode ser o início de uma reflexão mais profunda sobre nós.

Olho para minha árvore e penso naqueles que nos deixaram em 2021. Tantas pessoas queridas, parentes, amigos, vizinhos, clientes, pessoas jovens, velhas…. Penso também nos rumos que o Brasil vai tomando e se em 2022 teremos outro Natal parco ou se será melhor. Penso também que no próximo Natal minha filha estará mais perto da maioridade que neste ano, que eu e o meu marido estaremos também mais perto dos 50 e que a vida vai estar seguindo o seu curso.

Gosto de pensar no ano que passou e olhá-lo em perspectiva. Aconteceram muitas desgraças em 2021, vivi dias que eu não gostaria de ter vivido. Vi muitas pessoas sofrerem e chorarem, mas também vivemos momentos incríveis e únicos. Em 2021 me formei em Letras. A Duda terminou o Ensino Fundamental e o Galo foi campeão brasileiro depois de 50 anos sem ganhar esse título, o que me deixou imensamente feliz. Conheci novos escritores que se tornaram queridinhos, li mais de cem livros, revi amigas preciosas, criei um site literário e me joguei de cabeça na escrita e na crítica como profissão. Muitas amigas queridas publicaram seus livros e me honraram com um exemplar para que eu os comentasse. Recebi propostas de parcerias de trabalho, de projetos importantes e isso foi simplesmente esplêndido!

2022 vem aí, cheio e promessas e com 365 dias para aproveitar e viver. Claro que já comecei a fazer minhas listas (amo listas!), uma tradição que comecei com minha BFF Alessandra Oliveira e mantenho desde a nossa juventude. Geralmente elas não se cumprem porque vem a vida, o destino um Deus ex machina ou qualquer coisa que o valha e varre tudo isso, mostrando-nos que somos minúsculos, um pequeno pontinho nesse mundão. A diversão em fazer listas e tentar organizar a vida está em rever os nossos desejos no final do ano e perceber que o nosso eu de 31 de dezembro não reconhece o nosso eu de 1º de janeiro. Ou seja, evoluímos um tantão! E haja hipérboles nesse texto! Mas, que 2022 seja uma hipérbole de coisas boas e de momentos incríveis para todos nós!

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