vida de leitor

Leituras de agosto 2021

Agosto foi um mês rico em leituras. Comecei finalizando alguns livros que já estavam em andamento, participei de cinco leituras coletivas que foram incríveis e me ensinaram muito sobre as obras em questão, realizei leituras para a Pós-Graduação e algumas de trabalho. No geral, gostei muito das minhas escolhas e dos universos que visitei através dos livros. Nas palavras sábias de Aline Bei, em seu maravilhoso Pequena coreografia do adeus, “ler é viver vários mundos que não conhecemos” e foi o que fiz em agosto através dos livros que compartilho com vocês nesse texto.

  1. As aventuras de Huckleberry Finn – Mark Twain (Zahar, 2019): Essa obra faz parte do projeto Personagens Fundamentais da Literatura Mundial, que desenvolvo em parceria com a minha amiga Carol Felicori. Apesar de ser um livro de trabalho, me diverti acompanhando as aventuras desse garoto cativante, que nos faz pensar sobre as hipocrisias do mundo. O enredo dessa obra clássica é a fuga de Huck pelo Rio Mississipi, junto a Jim, um escravo fugitivo e as peripécias que vivem juntos durante essa travessia. O autor aborda temas da literatura fundamental, tais como racismo, liberdade e a sociedade elitista da época.
  2. O jogo da amarelinha – Julio Cortázar (Cia das Letras, 2019): Esse clássico da Literatura Latino-americana foi uma leitura coletiva com o Clube Leia Latinos, que tem curadoria da Jéssica Mattos. Desde os tempos da faculdade de Letras, eu tinha curiosidade em ler esse livro. Porém, as pessoas sempre diziam que ele é muito complexo e difícil de ler. Mas não foi o que achei. Esse livro me conquistou desde os primeiros parágrafos e se tornou uma das minhas melhores leituras de 2021. Seu enredo gira em torno de uma busca eterna de Horácio Oliveira, argentino radicado em Paris, na década de 1960, por Maga, uma uruguaia que vivia na cidade na mesma época que o protagonista. Essa procura não se limita a pessoa de Maga, mas sim de um sentido para a vida e para a nossa existência. O autor faz uma bela metáfora sobre as nossas questões existenciais e a brincadeira do jogo da amarelinha. Livro maravilhoso, cinco estrelas e favorito da vida.
  3. Ísis Americana: a vida e a arte de Sylvia Plath – Carl Rollyson (Bertrand, 2015): Desde que vi essa biografia da Sylvia Plath no Kindle Unlimited, senti vontade de ler a obra. Portanto, foi uma leitura espontânea, que puxou várias outras leituras do começo do mês de agosto. Gostei muito da abordagem do biógrafo, que não julgou a Sylvia, nem os seus familiares. Entretanto, não escreveu um texto raso e sem profundidade, mantendo-se imparcial. Ele contou a história dessa escritora polêmica, mas magnífica de uma forma objetiva e baseada nos relatos e nas pesquisas realizadas por ele ao longo dos anos. A escrita desse livro é fluida e a cada página que lia, ficava mais imersa na leitura, querendo saber mais sobre a história e a sua grande protagonista. Essa biografia me fez enxergar tanto a Sylvia como a sua obra com outros olhos. Sinceramente, me tornei uma grande fã de seu trabalho.
  4. A mulher calada: Sylvia Plath, Ted Hughes e os limites da biografia – Janet Malcolm (Cia das Letras, 2012): Li esse ensaio por indicação do livro anterior, mas diferente da biografia da Sylvia, não me apaixonei por esse texto de Malcolm. O objetivo desse livro é discutir os limites de um biógrafo, até onde podemos ir, invadir a vida das pessoas atrás de uma história. A autora fala muito sobre ética e questiona os sentimentos dos familiares quando a vida de um ente querido se torna objeto de estudo e principalmente de conjecturas maldosas por parte de escritores que desejam lucrar com os escândalos da vida alheia. Talvez o que tenha me incomodado nesse livro é o fato da autora se posicionar ao lado de Ted Hughes e de sua irmã Olwyn Hughes, que me pareceram pessoas não muito confiáveis na biografia anterior, que foi escrita depois desse livro da Malcolm. Entretanto, as discussões propostas por ela são válidas e muito importantes nos dias atuais.
  5. Mary Ventura e o Nono Reino – Sylvia Plath (Biblioteca Azul, 2019): Esse conto foi escrito pela autora em sua juventude e foi considerado ruim e diferente de seus escritos posteriores. A edição da Biblioteca Azul preservou o original, sem modificações, da forma que foi escrito por Plath adolescente, o que faz todo o sentido aqui. O enredo desse conto é uma garota que está saindo de casa contra a sua vontade para estudar em uma cidade grande. A viagem é uma alegoria da vida e do crescimento do indivíduo no mundo real. O nono reino é como se fosse um destino inexorável ao qual as pessoas seguem, sem questionar e sem se preocupar com suas escolhas inconscientes.
  6. E o vento levou – Margaret Mitchel (Nova Fronteira, 2020): Participei da Leitura Coletiva desse clássico com o Christian Assunção, que fez um excelente trabalho de pesquisa sobre a obra e o seu contexto histórico. Esse é outro livro que eu tinha muita vontade de ler, mas ainda não tinha surgido a oportunidade de realizar essa leitura. Incentivada pelo projeto do Chris e também por esse ser o livro favorito da Sylvia Plath, foi lido em agosto. Essa é uma daquelas obras grandiosas que fazem o leitor parar tudo o que está fazendo para ler o livro. Foi uma experiência rica e imersiva, daquelas que há muito tempo eu não vivenciava. Através de uma escrita fluida e muito potente, Mitchel retrata a guerra civil norte-americana, sob a perspectiva de uma mulher branca e sulista, oferecendo ao leitor a visão do Sul sobre a guerra. A autora imortalizou o nome de Scarlett O’Hara, uma das protagonistas mais complexas e detestáveis da Literatura Mundial nesse romance. Outro livro que entra para a lista de melhores leituras de 2021 e para os favoritos da vida.
  7.  15 contos escolhidos por Katherine Mensfield – Katherine Mensfield (Record, 2016): Descobri a escritora e seus contos através das aulas da minha Pós-Graduação. Essa edição está disponível no Kindle Unlimited e foi ela que abriu as portas desse universo lindo de Mensfield para mim. Logo no primeiro conto, reconheci uma escritora já muito admirada, Clarice Lispector, que diz ter sido influenciada por Mensfield. Nessa coletânea, a autora explora muito as questões sociais de seu país, Nova Zelândia. As diferenças de classe, o abismo social e a pobreza são temas recorrentes nos contos da escritora. Assim como Munro e Tchekhov, ela adota o enredo psicológico em seus contos, desenvolvendo os personagens através de suas ações cotidianas e de seus pensamentos e dúvidas em relação à vida e às escolhas que fazemos ao longo dela. Recomendo demais essa antologia e a escritora está no meu radar de próximas leituras.
  8. A cachorra – Pilar Quintana (Intrínseca, 2020): Essa foi uma leitura coletiva com o Clube Leia Latinos, já citado aqui. O livro conta a história de Damaris, uma mulher simples, negra, gorda e pobre, que vive em uma Colômbia esquecida pelos turistas e principalmente pelo Estado. Damaris é casada com Rogelio e o sonho do casal é ter filhos. Porém, estes não veem, provocando um vazio, uma ausência dentro da casa e do casamento dos dois. Em um momento de ímpeto, Damaris adota uma cachorrinha, que passa a ser o seu pilar de sustentação em uma vida sem sentido e sem perspectivas. Livro curto, potente e muito significativo.
  9.  Pequena coreografia do adeus – Aline Bei (Cia das Letras, 2021): Leitura Coletiva com o Leia Mulheres de Campinas, que teve a honra de receber a autora na live de discussão do livro. O leitor acompanha a história de Julia Terra, uma menina que enfrenta o divórcio dos pais, em uma família totalmente disfuncional, sofrida e onde não existe espaço para o diálogo, o amor e a compreensão. Bei utiliza uma linguagem poética, fluida, que conversa com o leitor como em uma peça de teatro. É um estilo único de escrita e que faz toda a diferença no enredo da obra, pois, ela fala muito nas ausências, no não-dito. Livro sensacional de uma das nossas grandes escritoras brasileiras contemporâneas.
  10. Tempos difíceis – Charles Dickens (Boitempo, 2014): Leitura Coletiva com a Mell Ferraz, do Blog Literature-se. Esse foi um livro que eu quase abandonei por duas vezes. O começo dele é bastante confuso, mas depois ele se torna mais fluido e começa a fazer mais sentido. Acompanhamos aqui um “educador”, que está implantando um sistema educacional baseado nos “fatos”, ou seja, na razão, ignorando toda e qualquer emoção ou sentimento. Em paralelo, acompanhamos uma cidade industrial no interior da Inglaterra, enriquecendo poucos e matando os trabalhadores através das péssimas condições de trabalho, da exploração de mão-de-obra e da poluição. As duas histórias se cruzam, ao estilo Dickens, como muitos personagens, muitas reviravoltas e com as consequências das atitudes de cada um voltando contra eles.
  11. Tudo junto, separado: fugas da pandemia – Thais Steimbach (Independente, 2021): Livro de ensaios escrito por minha amiga Thais e que me surpreendeu muito. A autora comenta de forma contundente e muito abrangente os sentimentos compartilhados durante esses dois anos de isolamento social e suas reverberações em cada um de nós. É impossível não se identificar com os textos, mas, eles carregam consigo uma leveza, um toque de ironia e muita sagacidade em dizer pouco, falando muito. É uma arte conseguir fazer isso. Recomento para todo mundo esse pequeno grande livro.
  12. Sula – Toni Morrison (TAG, 2021): Finalizei o mês tentando colocar em dia as leituras envidas pela TAG Curadoria, com o livro da maravilhosa Toni Morrison, que será lançado esse mês pela Cia das Letras. O enredo de Sula conta a história de uma garota negra norte-americana que nasce marcada. Marcada a ser diferente dos seus pares, a ser livre e a não seguir convenções. Colocado em um contexto onde era necessário ser uma pessoa comum para fazer parte de uma comunidade, Sula torna-se uma paria, a culpada por todos os males do Fundão, bairro onde é ambientada a obra. Em paralelo ao seu trágico destino, a autora aborda ainda a amizade que Sula desenvolve com Nell, uma moça convencional, mas que é capaz de compreender as assincrasias da amiga. Um livro brutal, no melhor estilo de Toni Morrison e que causa incômodo no leitor, levando-o a repensar seus conceitos de sociedade.

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