vida de leitor

Leituras de novembro de 2021

Fazer uma limpa radical na estante foi a melhor coisa do ano! Percebi que compras por impulso não levam a nada e só servem mesmo para gerar ansiedade nas pessoas. Outra observação que fiz através desse processo foi que nós temos fases na vida de leitor: em algumas, estamos mais focados em determinadas leituras, onde uma vai puxando a outra. Em outros momentos, queremos apenas relaxar através da literatura e temos as fases de maratonar canais literários e sair comprando ou colocando na lista de desejos todos os livros citados por aquele produtor de conteúdo.

A armadilha em agir assim é que muitas vezes, o gosto literário de determinado produtor não é compatível com o nosso e demoramos a perceber isso. Pode coincidir de lermos um livro indicado por uma pessoa, amar e achar que todas as suas indicações serão certeiras para nós. É preciso muita maturidade para saber quem somos nós e do que realmente gostamos. Compartilho essas experiências aqui porque sei que muitos leitores passam por todas essas fases e que muitas vezes, se sentem mal por agirem assim, como se fossem os únicos. Mas, é assim mesmo. O nosso atual estilo de vida e o bombardeio de informações são os causadores principais desses comportamentos incômodos e que tanto nos chateiam.

O fato é que quando nos conhecemos melhor, somos capazes de filtrar essas informações e fazer escolhas mais conscientes e certeiras. Novembro foi um mês onde todos os livros que li receberam entre 4 e 5 estrelas. Não tive leituras medianas. Não comprei livros por impulso e não entrei em inúmeras leituras coletivas das quais não iria dar conta. Procurei ler o que eu já tinha na estante e segui com os estudos do Projeto Trilha de Vozes Negras criado pela TAG. Participei da Leitura Coletiva de Gabriela, cravo e canela do Jorge Amado com o Clube Nuvem Literária, que esse ano fez leituras incríveis das quais eu deveria ter participado. Em novembro não tive leituras de ficção da Pós e também não participei do Leia Mulheres. Mas é isso aí: li o que senti vontade e foi incrível. Vamos aos livros lidos no mês!

  1. Os miseráveis – Tomo 1 – Victor Hugo (Penguim, 2017): Temos aqui um dos maiores colossos da Literatura Mundial, onde acompanhamos a trajetória de Jean Valjean, um homem que foi condenado à prisão por doze anos após ter roubado um pedaço de pão. Através de vários personagens icônicos e inesquecíveis, onde suas histórias se cruzam com a do protagonista, o autor discute o abismo social, moral, justiça e ética. Esse primeiro volume é incrível e não vejo a hora de finalizar o segundo.
  2. A sangue frio – Truman Capote (Cia das Letras, 2003): Livro reportagem, que inaugurou um novo gênero literário, que é o romance jornalístico, conta da história de uma família do interior do Kansas que foi brutalmente assassinada em sua casa, aparentemente sem explicações. O autor resolveu escrever um artigo sobre o caso para o jornal onde trabalhava, mas, chegando lá e conhecendo as pessoas envolvidas, os moradores da cidade e os assassinos, transformou o artigo em um romance, onde ele desenvolve um perfil psicológico de todos os “personagens” desse drama. Excelente livro que em breve terá resenha aqui.
  3. Holocausto brasileiro – Daniela Arbex (Geração Editorial, 2013): Aproveitando a vibe de livros jornalísticos, li um dos e-books que estava há mais tempo no meu Kindle. A jornalista brasileira nos conta, de forma um pouco apelativa e romantizada, a tragédia de Barbacena, que foi a internação compulsória dos párias das famílias brasileiras no Hospital Psiquiátrico de Barbacena, também conhecido como Colônia. Essas pessoas eram levadas para o hospício para morrer. Viviam em condições subumanas, passando por torturas, sessões de eletrochoques, fome e frio, além de outras necessidades básicas. E o pior de tudo é que esse genocídio era de conhecimento das autoridades da época que nada faziam, pois se beneficiavam de alguma forma com a desgraça alheia. É uma denúncia grave e que não pode ser esquecida.
  4. A marca humana – Philip Roth (Cia das Letras, 2002): Através de uma premissa muito interessante, o autor discute temas muito importantes e atemporais nesse livro excelente. Coleman Silk, o protagonista desse romance, é um professor universitário que é acusado de racismo por usar uma palavra dúbia em sala de aula. Após essa denúncia, sua vida entra em uma espiral de degradação que o leitor acompanha de forma contundente. Em breve teremos resenha sobre ele por aqui.
  5. Gabriela, cravo e canela – Jorge Amado (Cia das Letras, 2012): Ler Jorge Amado é sempre um deleite! Quando finalizo um de seus romances me questiono porque não o leio com mais frequência, sendo que gosto tanto de seus livros. Essa foi uma leitura coletiva com o Clube Nuvem Literária e que trouxe reflexões muito profundas para mim. O enredo de Gabriela, gira em torno do romance da protagonista que dá título ao livro com o árabe Nacib, um comerciante de Ilhéus. A história é ambientada no ano de 1925, onde a produção do cacau estava em alta e a cidade prosperava a cada ano. Esse fundo histórico e político permeia toda a obra e faz com que o livro seja muito maior que um simples romance romântico. Foi a minha melhor leitura de novembro e em breve, termos uma resenha sobre ele aqui, uma das que mais me orgulho de ter escrito.
  6. Notas sobre Literatura, Cultura e Ciências Humanas – Mikhail Bakhtin (Editora 34, 2017): Últimos textos do filósofo russo, ainda inacabados, mas que mostram o seu amor pelos livros, pela literatura e sua admiração por Dostoievski. O autor faz algumas digressões sobre a literatura como cultura, não a separando de um processo cultural de identidade dos povos ao longo do tempo. Como sempre, Bakhtin nunca erra. Essa foi uma leitura indicada na Pós e que tive muito prazer em realizar.
  7. Menina má – Willian March (Darkside, 2016): Clássico de suspense que conta a história de uma garotinha de oito anos que é uma assassina em série. O autor coloca como conflito da trama a mãe da protagonista, que é uma mulher simples, bondosa, simpática, que descobre essa faceta da filha e precisa lidar com a situação sozinha, pois o marido está trabalhando em outro país. A construção dessa personagem é fascinante, pois ela vai morrendo por dentro a cada dia e isso transparece na sua aparência física. Apesar do final Deus ex machina, é um bom livro de suspense e que gera muitas reflexões no leitor.
  8. Fahrenheit 451 – Ray Bradbury (Biblioteca Azul, 2019): Distopia clássica, que forma a tríade distópica mais famosa da Literatura, junto a 1984 do George Orwel e Admirável Mundo Novo, do Aldos Huxley, conta a história do bombeiro Guy Montag, que se rebela contra o sistema imposto nos EUA e resolve lutar pelos livros. Nesta sociedade, a função dos bombeiros não é mais apagar incêndios, mas sim, queimar livros, que são considerados maléficos e nocivos ao ser humano por despertar nele reflexões e pensamento crítico. Um dia, Guy se depara com uma biblioteca escondida por seu chefe e rouba alguns exemplares dela, dando início à sua jornada de luta contra o sistema. Livro sensacional, que deve ser lido por todo mundo.
  9. Sobre o exílio – Joseph Brodsky (Editora Aynê, 2020): Livro de não-ficção que contém dois discursos do escritor russo onde ele fala sobre o exílio de escritores. O primeiro discurso foi feito em um encontro de autores para debater o tema e o segundo é o seu discurso de agradecimento ao receber o Prêmio Nobel de Literatura. Apesar de falar sobre a sensação de estrangeirismo, Brodsky nos leva a muitas reflexões sobre a diáspora, a censura, a perseguição de determinados povos, o peso de ser um judeu e as atrocidades cometidas pela humanidade em nome da “paz”. Ele também faz duras críticas aos nossos hábitos de leitores de sempre buscarmos livros nos quais esperamos nos reconhecer, virando as costas para as histórias dos outros que não têm nada a ver com a nossa existência, mas com coisas que acontecem mundo a fora e que preferimos não saber, fechar os olhos a elas e continuar vivendo nossas vidinhas de sempre, ignorando a maldade humana. Excelente livro para pensar, refletir e se colocar no lugar do outro.

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