literatura

Por que ler Dinah Silveira de Queiroz

Escritora premiada, nascida em uma família dedicada às letras, com muitos parentes que contribuíram de forma contundente para a literatura nacional, Dinah Silveira de Queiroz foi a 2ª mulher a ocupar uma cadeira na Academia Brasileira de Letras e deixou um legado enorme de textos, incluindo contos, romances, peças de teatro e crônicas. Um fato marcante na biografia da autora foi a morte prematura de sua mãe, vítima da tuberculose, algo que inspirou Dinah a escrever seu livro de estreia, Floradas na serra.

Foi uma grande entusiasta da ficção científica e durante o período em que morava com a tia, em uma chácara no interior de São Paulo, na Serra da Mantiqueira, aproveitava as visitas do pai, que lhe dava muitos livros, para lerem juntos H. G. Wells, sendo sua história predileta A guerra dos mundos. Aos 19 anos casou-se com um advogado e estudioso da obra de Montaigne, escritor e ensaísta que despertou na autora a sua vocação para a escrita. Seu livro de estreia foi contemplado com o Prêmio Antônio de Alcântara Machado, concedido pela Academia Paulista de Letras, além de ser adaptado para o cinema.

Em 1954, foi contemplada com o Prêmio Machado de Assis, concedido pela ABL, pelo conjunto de sua obra. Em 1962 a autora mudou-se com o segundo marido (ela ficou viúva do primeiro esposo, que lhe apresentou Montaigne) que era diplomata para Moscou. Ainda assim, ela tentava contribuir com algo para o Brasil, enviando suas crônicas a serem publicadas em jornais e difundidas nas rádios do Ministério da Educação e na Rádio Nacional. Esses textos foram posteriormente compilados em três volumes, intitulados Café da Manhã, Quadrante I e Quadrante II. Foi também biógrafa da Princesa Isabel, além de escrever romances com ideologias cristãs, inspirados em discursos do Papa Paulo VI. Voltou ao Brasil, depois morou ainda em Roma e finalmente em Lisboa onde faleceu.

Dinah foi a sétima ocupante da cadeira nº 7 da ABL, eleita em 10 de julho de 1980, substituindo Pontes de Miranda. O fato dela ter sido a 2ª mulher a ocupar uma cadeira na Academia é de extrema significância: até 1980, tínhamos apenas uma mulher na ABL, a cunhada de Dinah, Rachel de Queiroz. Sabemos que esse cânone é escolhido ainda de forma muito patriarcal, afinal, Júlia Lopes de Almeida, uma das fundadoras da Academia, não pode ocupar uma cadeira por ser mulher. A quebra de paradigmas tanto na obra quanto nas atitudes de Dinah, são importantes para o movimento feminista e para que a diversidade de gênero e de raça seja respeitada na concepção e criação do cânone literário.

Por fazer parte de uma família voltada às letras, Dinah teve acesso aos grandes clássicos da literatura mundial, além de acompanhar a literatura contemporânea. Dessa forma, suas principais influências literárias foram Montaigne e H. G. Wells, incentivada por seu pai e seu primeiro marido. O sr. Alarico Silveira contribuiu bastante para que Dinah descobrisse a literatura e o seu fascínio pelas histórias de ficção científica, algo que posteriormente seria incorporado em sua própria obra, em romances como Margarida La Roque, que apresenta elementos fantásticos e os contos Eles herdarão a terra e Comba Malina.

Montaigne dispensa apresentações e continua sendo uma forte inspiração para novos escritores. No caso de Dinah, levou-a a escrever seus primeiros textos, contos que foram publicados em jornais. Falando em Margarida La Roque, estefoi um livro à frente de seu tempo e que apontou as desigualdades de gênero. Completamente diferente de Floradas na serra, o segundo romance da escritora, foi uma grande oportunidade que ela encontrou de mostrar a sua capacidade criativa e textual, abordando temas como a paixão sem limites, loucura, questões psicológicas, apoiando o seu texto em elementos fantásticos, relatos de viagens quinhentistas, terror psicológico e um final desconcertante. O livro se tornou um best-seller e recebeu elogios da crítica e do público, inclusive da escritora francesa Collette e de jornais europeus.

Como podemos observar, a autora foge da sua zona de conforto, experimentando vários estilos literários, incluindo os contos, romances históricos, realismo mágico e ficção científica. Com uma obra vasta e versátil, Dinah se empenhava muito em sua qualidade de escrita e nos temas abordados em seus livros. Para os romances históricos e biográficos, as pesquisas eram feitas de forma metódica a fim de dar credibilidade aos fatos reais. Já nos textos voltados ao fantástico, a autora se esmerava em contar boas histórias, a fim de manter o leitor preso à trama e sempre caprichando nos desfechos para deixa-lo reflexivo. Nos contos e crônicas a autora manteve a principal base de seu legado textual: o fator humano e as reações das pessoas diante do insólito, da dor e do revés. Características muito presentes na obra de Montaigne.

Um ponto conflitante na carreira de Dinah, mas que só é criticado de forma mais enfática no presente, foi o fato dela ser convidada pelas autoridades a escrever dois romances históricos em homenagem a grandes eventos – O romance A muralha, escrito em 1954, foi encomendado para as comemorações do 4º centenário da fundação de São Paulo. Neste romance conhecemos a saga dos bandeirantes, que têm um desfecho com a Guerra dos Emboabas. A autora é bastante parcial neste texto, dando ênfase aos méritos dos bandeirantes, pessoas que antes víamos como heróis, mas hoje os temos como os grandes vilões do genocídio dos povos originários. Na época de sua publicação, o livro fez bastante sucesso e anos depois, foi adaptado para a televisão em uma minissérie de grande sucesso. Não podemos tirar o mérito da escritora em sua pesquisa, em sua escrita e por contar uma narrativa que feliz ou infelizmente, fez parte da nossa História.

 Já em Os invasores, romance encomendado para as comemorações do 4º centenário da fundação da Cidade do Rio de Janeiro, acompanhamos a chegada dos franceses na capital fluminense, onde já conseguimos perceber as idiossincrasias formadoras do carisma e do espírito carioca. Ambientado em 1710, o humor contracena com a tragédia ao longo de toda a saga que pretende rechaçar os invasores franceses. Essa obra da autora está esgotada há anos e temos pouco sobre ela disponível para pesquisas. Entretanto, também fez bastante sucesso no ensejo de seu lançamento e conta mais uma vez, em uma narrativa potente, parte da nossa História.

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